Uma nova paróquia: como assim? Algumas provocações! – Parte 2
6) Aqui, pensando em “casa”, é importante vencer a concepção territorial desta categoria. A Comunidade-Igreja é casa que recebe não só os que estão geograficamente instalados nos espaços territoriais da paróquia, mas a todos os que queiram, por algum motivo, habitar sob aquele teto, independente de onde venham e por que vieram. Se ali é lugar de afeto, compromisso e missão, então não se pode deixar de fora os “forasteiros” que vêm de outras partes para ali viver a experiência da fé. Forasteiros somos todos enquanto peregrinos, caminheiros, habitantes de casas provisórias (paróquia significa casa provisória, paroquiano é forasteiro, pároco é o que está de passagem!!). Assim, hoje a paróquia não pode ser um “cercadinho” que cuida e atende só os que estão no seu território geográfico e só tem a esses como seus. Hoje se constituem novos territórios. Os afetos, os gostos, os interesses, os convites, os ambientes vão estabelecendo novos “territórios” e novos motivos de pertença. O importante é estar dentro e em espírito fraterno, missionário e evangelizador. O endereço no mundo conta pouco na nova paróquia. O que conta é estar na “casa de fé e de irmãos”, casa da Palavra, casa do Pão, casa da Caridade, mesmo que se venha do outro lado da cidade, do outro bairro, da outra paróquia. “Num mundo plural, não se pode querer um único modo de ser comunidade” (DGAE, nº 61).
7) Os desafios na configuração da nova paróquia são muitos e grandes, mas urgentes e tremendamente necessários. Há quem prefira a velha paróquia: sacramentalista, bairrista, intimista, devocionalista, exclusivista… e tantos outros “istas”, sintomas de doença e caduquice pastoral. É preciso vencer o intimismo religioso, superar a religião midiática e sem chão, acolher pastoralmente os novos modelos de família. É preciso investir nas redes sociais, no mundo virtual (“a ausência da paróquia nestes meios é inconcebível”, Doc. 104, nº 200), nas outras territorialidades possíveis e até na transterritorialidade. Contudo, não se pode cancelar totalmente a delimitação territorial e geográfica da paróquia, senão quem cuidará das favelas, das zonas de prostituição e de tráfico de drogas, dos bolsões de pobreza e criminalidade, dos presídios, dos centros de ensino e de poder, dos hospitais e clínicas de recuperação, dos asilos, da zona rural? Cada um desses ambientes faz parte de algum lugar, de algum território paroquial. E não podem ficar de fora do cuidado pastoral. Clamam por solicitude pastoral, por presença samaritana da Igreja. Não podem deixar de ser “lugares de missão”. Não basta cuidar dos que vêm a nós ou dos que conseguimos atrair ou remeter à Igreja. É preciso ir também aos que não vêm, não foram atraídos, não foram alcançados e não se deixaram alcançar pela ação da Igreja.
8) Outros desafios ainda são o burocratismo, o papelismo, o carimbismo, o impessoalismo, o formalismo das secretarias e lugares de atendimento dos fiéis, tanto da parte de secretários paroquiais quanto do clero.
9) A paróquia e a Igreja não podem ser uma ONG piedosa, disse o Papa Francisco, uma prestadora de serviços religiosos, mas casa de hospitalidade alegre e misericordiosa, servidora da vida, mãe dos pobres e fracos, profética e audaciosa.
10) Em perspectiva cultural, o relativismo e o fundamentalismo são dois extremos do pêndulo religioso atual. Há os “apocalípticos” que querem uma Igreja completamente nova e diferente, sem até mesmos os elementos distintivos da sua natureza. E há os fundamentalistas e saudosistas que querem a “velha” Igreja que foi sepultada pelo “malvado” Concílio Vaticano II.
11) Num tempo histórico, já considerado por alguns como pós-cristão, urge apresentar uma teologia da história, uma antropologia religiosa fundada na abertura à transcendência, um Estado laico sem ser ateu, nem amoral (pior ainda que imoral!), um mundo como lugar teológico de missão, uma conversão das pessoas e das estruturas a Jesus e ao Reino, para muitos uma utopia irrealizável e fantasiosa. “A conversão pastoral depende de uma conversão pessoal a Cristo. […] A conversão pessoal e a conversão pastoral andam juntas” (Doc. 104, nº 173-174).
CONTINUA EM NOVEMBRO