Homilia para a ordenação presbiteral do Padre Alex Cristiano dos Santos
No ano jubilar de nossa Igreja Diocesana, no alto dos seus sessenta anos de evangelização, reunimo-nos para consagrar ao serviço sacerdotal este nosso irmão, Diácono Alex. Nenhuma celebração litúrgica leva consigo uma marca e um efeito exclusivamente pessoais, nem aquelas, como hoje, que ungem uma pessoa para uma missão. A pessoa é uma e única, mas a missão é ampla, é coletiva, é pública, é colegial, é transversal, é eclesial. Nenhum ungido faz carreira isolada e exclusiva. É sempre um caminho coletivo, um caminho na Igreja, feito a muitas mãos, a muitas vozes, num fecundo relacionamento com muitos outros discípulos missionários. Em cada sacramento celebrado, há sempre um aprendizado comunitário. Há um efeito, uma memória, um reavivamento da natureza e da missão da Igreja inteira. Uma vida e uma missão tocadas pela graça sacramental recordam e remetem à vida e à missão da Igreja toda. Assim, caro Diácono Alex, tua ordenação recorda e reacende no coração da nossa Igreja Diocesana alguns ensinamentos que reorientam e renovam nossos compromissos e empenhos como Igreja de Cristo. Parto dos textos que escolheste para este teu dia e de orações deste rito de ordenação.
Escolheste o belo texto do livro dos Números, onde Moisés confronta-se com uma missão que parece superar suas forças, sua paciência, sua capacidade. “Eu não posso carregar sozinho todo esse povo: é pesado demais para mim” (Nm 11,14). De fato, Diácono Alex, tua missão não é para ser carregada sozinha. O povo não é só teu! A bem da verdade não é teu! É de Deus. E este povo tem muitas fomes, muitas feridas, muitas demandas… Por isso, a ação pastoral e evangelizadora para a qual serás ungido na condição de presbítero será uma missão a ser partilhada com outros que já estão na lida, com outros que tu suscitarás pelo teu ministério e também comigo, que te confiarei aquilo e aqueles que foram confiados por primeiro a mim. Tu terás ao longo do caminho duas opções: ou desistir, porque não suportarás mais, porque te fatigaste, porque percebeste que a missão ultrapassa teus empenhos, tuas habilidades e tuas forças; ou terás a opção de partilhar teu ministério com outros, como eu partilho o meu contigo.
Este texto do Pentateuco me oferece o pretexto de convidar-te, como algo essencial no teu ministério, a abrir-te àqueles que te podem ajudar a levar adiante o cuidado pesado do nosso povo. Eu te convido a abrir-te a uma relação sempre mais fecunda, criativa e próxima com os leigos e leigas que encontrarás no caminho da Igreja; e abrir-te com amor verdadeiro e sincero aos teus irmãos presbíteros, construindo com eles uma bela fraternidade sacerdotal. Não podes carregar sozinho o Povo de Deus! Com estes dois grupos de irmãos, os leigos e os demais sacerdotes, juntamente comigo, poderás e conseguirás cuidar mais e melhor do rebanho do Senhor confiado à nossa solicitude.
No texto do livro dos Números, Deus derrama sobre setenta homens do espírito derramado sobre Moisés, para que fossem colaboradores preciosos do grande líder na travessia do deserto da libertação. O Espírito do Senhor também foi derramado sobre todos os batizados, tornando-os povo santo, amado e eleito de Deus. Destes batizados, o Senhor “chamou os que Ele quis” – eis teu lema – para o serviço de especial consagração no seio deste povo. Chamou os Doze primeiros, chamou-me, chamou teus irmãos diáconos e presbíteros, chamou a ti, caro Alex. Pronunciou teu nome com amor, apostou e investiu em ti. Dentre os Doze primeiros apóstolos, tens onze que te servem de exemplo e estímulo. Foge de Judas, o traidor. Põe teus olhos nos outros onze, em Matias, em Paulo. Dentre eles, encontrarás algum com teu perfil humano e vocacional, com tuas grandezas e baixezas, que poderás imitar, para colocar-te no caminho de Jesus, primeiro e único Mestre. Segue os que te levem a Cristo. É a Ele que deves chegar e verdadeiramente imitar. Teu coração precisa ser crístico, para que alcances, em boa medida, o coração do pastor belo e bom que te chamou.
O Espírito ungiu os corações dos milhares de leigos e leigas que encontrarás nas comunidades. O Espírito ungiu os teus irmãos sacerdotes para formarem contigo e comigo uma comunidade de ungidos para o anúncio do Evangelho, para ampliar os domínios do Reino que suplicamos sempre que “venha a nós”, pelos modos e meios humanos e históricos pelos quais o Reino se instala e cresce. Será cruel e estéril esta nossa missão se não a vivermos na colegialidade, na valorização dos ministérios e serviços, no reconhecimento dos carismas e atividades, no estímulo constante aos vários estados e modos de pertença ao Corpo Místico do Senhor, que é a Igreja. “Somos em Cristo um só corpo e, cada um de nós, membros uns dos outros”. Assim nos ensina o Apóstolo Paulo hoje na Carta aos Romanos (12,5). Portanto, Diácono Alex, valoriza teus irmãos leigos. O Espírito age igualmente neles e em nós. Conta com eles, confia neles, escuta-os, entrega tarefa a eles, coloca-os em lugares de decisão, mantém sadias e afetuosas relações com eles. Lembra-te, contudo, de que eles não estão a nosso serviço! Estão a serviço da Igreja! Não são nossos empregados! Não recebem missões que nós damos a eles! E só aquelas que lhes damos! Não! Eles têm dignidade própria. A missão deles brota do Batismo e não das tuas e das nossas concessões e convites. Eles não estão na Igreja. Eles são Igreja! Gasta tempo com eles, com a formação deles, com a fé deles. Para eles, o teu ministério e o meu emanam de Deus, como ministério da santificação, da instrução, da animação, da presidência! Eles, os leigos e leigas, são a grande e maior presença no Corpo do Senhor, a Igreja. Nossas relações com eles precisam ser sempre boas, dialogais e respeitosas. E nem sempre são, infelizmente! Mas devem ser. Eis um lugar de conversão para nós.
Mas não te esqueças também – e isso me é ainda mais importante dizer-te hoje – que fazes parte de um presbitério, de um corpo sacerdotal. Tu não és o primeiro nem o único. Une-te aos teus irmãos sacerdotes. Ajuda-nos a construir uma pastoral presbiteral, ainda tão tímida entre nós. Olha e imita teus irmãos padres que se parecem mais com Jesus, não os outros! Oferece tua amizade, teu coração aberto, tua companhia. Come com eles o pão das nossas reuniões, dos nossos projetos, da nossa assembleia diocesana, da tua e nossa tão preciosa catequese! Mostra-te próximo, amigo, irmão. Precisamos construir uma geração de sacerdotes que se amem mais, que disputem menos, que se valorizem mais reciprocamente, que vivam com humildade e discrição, que se apoiem mais, que falem melhor uns dos outros… Temos dado alguns exemplos feios a nossa gente! Então, querido Diácono Alex, tens muitos leigos e um belo colégio presbiteral que deseja e precisa dividir contigo o peso de carregar nosso povo, povo de Deus, cuja história, na travessia dos desertos deste mundo, está confiada a nós, na unção do mesmo Espírito que circula e age em nós todos.
O Senhor te chamou e te constituiu para estar com ele, para enviar-te a anunciar, para exorcizar todo mal que rouba a vida, a dignidade, a fé, as esperanças, a história bonita de nossa gente. Tens o poder de Jesus e estás revestido da missão de expulsar os demônios com cara de gente e aqueles cujas caras não enxergamos. Eles estão por aí, danificando e ferindo vidas e comunidades inteiras. Não tenhas medo! Quem expulsa os demônios que infernizam a nossa gente é o Cristo. Pensa em Jesus, que te chamou, e pronuncia a verdade de Deus sobre os demônios de muitos nomes e faces, demônios que têm cara e endereço, quem têm CPF e CNPJ. Pronuncia sobre eles a novidade do Reino, dize a eles que vida vale, que a terra vale, que o mundo vale, que Brumadinho vale. E pede a Jesus que te ajude a livrar nosso povo daquilo que não vale! Entendeste? As tragédias precisam matar nossos silêncios! E ressuscitar nosso profetismo! Serás consagrado a Deus para a salvação, histórica e sobrenatural, da humanidade! E aceitarás isto em breve!
Finalmente, no prefácio desta celebração, revela-se o mistério do sacerdócio ministerial: dando a vida por Deus e pela salvação de todos, os sacerdotes procuram assemelhar-se cada vez mais ao próprio Cristo, testemunhando na missão de cada dia a fidelidade e o amor a Deus, que chamou os que ele quis e os enviou como irmãos entre irmãos, como uma comunidade de ungidos pelo mesmo Espírito para diferentes carismas e ofícios, como discípulos missionários chamados a viver com unção, com profetismo, com colegialidade a missão de ser Igreja. Uma Igreja que cuida, com fadigas e cansaços, com alegrias e paixões, do bom e santo povo de Deus, que sofre as investidas do mal e as securas dos desertos da história, mas alimentado da Eucaristia, reconciliado pelo perdão, confortado nas adversidades do corpo e da alma, ungido pelo Espírito, avança com fé na direção do dia sem ocaso, o dia de Deus, nossa meta, nossa plenitude, nossa firme utopia. Eis, Pe. Alex, tua missão de todos os dias! E que estes dias sejam muitos! Amém.
Dom José Carlos de Souza Campos, Igreja Santa Rita de Cássia, Pará de Minas, 02/março/2019.