Homenagem a Dom Belvino
Ao irmão presbítero feito Bispo há 25 anos!
(Homenagem a Dom Belvino em 30 de setembro de 2006)
Faço parte das quase cinco dezenas de sacerdotes ordenados por Dom José aqui na nossa diocese e praticamente posso dar notícia destes 18 anos de sua presença entre nós, pois já era seminarista de teologia quando ele chegou. Acho que nunca nos sentamos para tomar alguma coisa juntos, nunca nos encontramos para conversar sobre nossas vidas, nunca nos visitamos nos nossos aniversários nem nos descontraímos em algum passeio juntos e tantas outras coisas não fizemos. E não as fizemos porque não quisemos. Não acredito que fossem impossíveis. Apenas nos faltou iniciativa ou um pouco mais de amizade. Mas mesmo sem ter vivido estas coisas que nos fariam conhecer-nos reciprocamente – e isso daria outra qualidade ao nosso relacionamento – pude reconhecer e admirar qualidades e virtudes que não se vêem normalmente em homens da hierarquia episcopal. Alguns são mais bispos por fora que por dentro e outros – e são esses os admiráveis! – são mais bispos por dentro que por fora! De fato, Dom José nunca ostentou a indumentária episcopal. Com exceção do colarinho, quase sempre desabotoado, e do terno preto e muito simples, dos sapatos empoeirados – sinal de que não se dedicou só aos centros urbanos! – e da cruz peitoral, quase sempre a mesma e escondida no bolso da camisa, não vi, com a freqüência com que são vistas em outros bispos, as suas demais insígnias episcopais. Não tem coleções de anéis, nem de báculos, nem de mitras… e, se as tem, mantém-nas guardadas. De batina episcopal nunca o vi, senão no retrato oficial, onde aparece com ela (ao que parece sem a faixa!) de olhar profundo e equilibrado entre o severo e o dócil. Homem que, quando quer contar histórias e estórias – e como as conhece aos montes! – que o povo simples entende e guarda, consegue prolongar a pregação sem cansar os ouvintes e fazê-los dar boas gargalhadas. E todos sabem recontar alguma história que o bispo um dia contou. Homem que, quando quer, cita os literatos clássicos, os filósofos, os santos, os cientistas, os nomes grandes da história… Poderia se quisesse, mas nunca esbanjou isso, brincar e nos brindar com o latim, que conhece como um mestre, mas prefere frases curtas e em português quase corriqueiro. De modos e jeitos simples, até no modo como segura o garfo, sem imponência nem pompas, sem rompante nem gala! Esse é nosso Dom José. Mais se assemelha aos pequenos que aos graúdos. Mais parece do clero de baixo que do escalão superior. Mais José que Dom. Mais dos simples que dos grandes. Mais pastor que epíscopo. Se ele fosse bispo exatamente como muitos o quereriam, certamente seria quase um Deus ou um monarca ou um déspota, menos o José, o Dom José, como é. Talvez não tenha sido ou tenha feito tudo o que quereríamos ou esperaríamos dele, mas quem, em outra missão, conseguiu ser tudo o que queriam os outros sem deixar de ser ele mesmo? Dom José poderia ser bispo de outras formas – tantas quantas as cabeças dos padres que ele tem – mas uma coisa é verdade: é bispo como seu coração e sua fé lhe sugerem. É bispo a partir de dentro. Não mostra tanto a cara, mas o coração. Não faz tanta questão da aparência, mas da autenticidade. Não abre mão do que lhe sugere o seu Deus para fazer o que querem os seus sacerdotes ou os seus interlocutores. Não vendeu sua identidade humana e episcopal à fama ou à superficialidade, como outros fizeram. Isto tudo o torna admirável. Ninguém é perfeito. Ele também não! Mas pelas coisas que fez e pelas que deixou de fazer, pela história entre a chegada e a saída dele, nossa diocese não será mais a mesma. Há uma marca indelével, há um odor impregnado, há “algo invisível e misterioso” que as pessoas que dão tudo e o melhor de si deixam para trás quando se vão! Certamente cada um terá o que contar – chorando ou rindo – quando nosso Dom José for Dom José sem ser nosso. Ao nosso irmão presbítero, nosso irmão “mais velho”, feito bispo e feito nosso, desejamos todo o bem que se pode desejar a quem constrói conosco um pedaço da nossa história diocesana. Dom José, se eu não disse antes que o admirava, digo agora, mas não é de agora este sentimento! Beijo suas mãos, envelhecidas no meio de nós, e que tantas vezes nos abençoaram e que um dia me fizeram padre. Obrigado, pelo seu jeito bem mineiro, simples por fora, humilde por dentro, de ser padre e bispo!
Estas são palavras de outro José, que seu ministério episcopal tornou padre. Com carinho e afeto, em meu nome e dos meus irmãos presbíteros. Aqui, este José que escreve era padre e representante do clero diocesano.
Em 2019, este José Carlos, que Dom José Belvino ordenou diácono, padre e bispo, cumpriu o doloroso dever de sepultar o amigo, bem mais próximo e mais amigo depois desta sua data jubilar. Muitas coisas mudaram! E para melhor, entre os 25 anos, em 2006, e os 37 anos, em 2018. Deus seja louvado!
Descanse hoje em paz, servo bom e fiel, meu amigo, meu irmão, meu pai!