Homilia de Dom José Carlos para a Ordenação Presbiteral do Diácono Maurílio da Conceição de Oliveira Aguiar
HOMILIA PARA A ORDENAÇÃO PRESBITERAL DO DIÁCONO MAURÍLIO DA CONCEIÇÃO DE OLIVEIRA AGUIAR
SEGUE-ME!
Eis o dia em que teu chamado da parte de Deus exige uma resposta definitiva e plena. Estamos felizes com teu sim ao “segue-me” de Jesus, no início do ano vocacional. As leituras da Palavra de Deus e a ordenação deste dia nos recordam três aspectos imprescindíveis na vivência fecunda e madura do ministério sacerdotal:
- Antes de ser sacerdote é preciso fazer-se discípulo. Só pode ser sacerdote quem for antes e permanecer sempre discípulo de Jesus.
O encontro pessoal com Jesus Cristo, fundamento da fé, gera um novo sujeito, o discípulo, o crente.
Documento de Aparecida (243): O acontecimento de Cristo é o início desse sujeito novo que surge na história e a quem chamamos discípulo. “Não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas através do encontro com um acontecimento, com uma pessoa, que dá um novo horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva”. Isso é justamente o que todos os evangelhos nos conservaram como sendo o início do cristianismo: um encontro de fé com a pessoa de Jesus.
A própria natureza do cristianismo consiste em reconhecer a presença de Jesus Cristo e segui-lo. Essa foi a maravilhosa experiência daqueles primeiros discípulos que, encontrando Jesus, ficaram fascinados e cheios de assombro frente à presença excepcional de quem lhes falava, diante da maneira como os tratava, coincidindo com a fome e sede de vida que havia em seus corações (DAp 244).
Foi assim também com Mateus: Jesus o viu e chamou. A iniciativa é de Jesus. Mateus levantou-se e seguiu. A resposta exige que Mateus se torne discípulo: ir com Jesus.
O que significa levantar-se e seguir?
Levantar-se: trocar de posição, pôr-se em movimento, sair de um estado.
Seguir: ir com alguém, ir como alguém vai, ir onde alguém vai, ir a quem outro vai também, ir para fazer algo. Ir com Jesus, como Jesus, onde Jesus vai, a quem Jesus vai, para fazer o que Jesus fez… O seguir Jesus mudou para sempre a vida, o comportamento, a consciência, a moral, a história de Mateus (Mt) ou Levi (Mc e Lc).
Hoje, com dor, percebe-se um desconhecimento da pessoa de Jesus ou um olhar espiritualista de sua identidade e sua missão que tira de Jesus todas as implicações éticas e históricas do seu Reino, do seu Evangelho, do seu mistério. São dados da síntese nacional da escuta para o Sínodo dos Bispos. A fé, para muitos, é rito, é norma, é cumprimento de preceitos obrigatórios, é medo do inferno, é desencargo de consciência, é tudo… menos um encontro com a pessoa de Jesus ressuscitado. Encontro que aquece o coração, explica a história, responde às perguntas fundamentais acerca do sentido da vida e do caminho, gera conversão e testemunho, promove ousadia e profecia.
- Não há verdadeiro discípulo que não seja também missionário. O encontro pessoal com Jesus gera anúncio alegre e testemunho crível. O discípulo missionário pode e deve ir a todo lugar. Não há restrições. Não há rejeitados. Não há os antecipadamente perdidos. “Aqueles que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes… Não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Mt 9,12-13). Doentes e pecadores são todos os que carecem de sentido para a vida, de horizonte para o caminho, de conversão do coração na direção da plenitude de vida. Ensina-nos o Papa Francisco: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (EG 49). O Cristo que está em ti, diácono Maurílio, pode ir em ti a todo lugar, a toda criatura, a todo ambiente, desde que seja para convidar à conversão e anunciar a salvação em Jesus Cristo. Ninguém pode ser descartado antes de ser chamado à fé.
Francisco: “A alegria do Evangelho, que enche a vida da comunidade dos discípulos, é uma alegria missionária” (EG 21). E ainda o Papa: “Cada cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de Deus em Cristo Jesus; não digamos mais que somos discípulos e missionários, mas sempre somos discípulos missionários” (EG 120). O discípulo que não é missionário é alguém que encontrou Jesus (se é que o encontrou mesmo!) e o guardou para si. O missionário que não é discípulo de Cristo pode estar trabalhando e se cansando por qualquer outro mestre que não Jesus. Discípulos missionários somos todos, somos sempre, somos em todo lugar.
- Toda vocação recebida é para edificar o Corpo de Cristo até que se alcance a unidade da fé, o estado do homem perfeito e a estatura de Cristo em plenitude.
O texto paulino carrega a segunda leitura com o tema da unidade, sua fundamentação, seus agentes, seus frutos. A fundamentação da unidade está no ritmo unitário do mistério da fé: um só Corpo místico de Cristo, um só Espírito, uma só esperança, um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus. Os agentes da unidade são aqueles que receberam de Cristo a graça para construir o Corpo de Cristo que é a Igreja, a saber, apóstolos, profetas, evangelistas, pastores, mestres. Todos capacitados para o ministério da unidade da fé, para o serviço da edificação do Corpo de Cristo, para que todos alcancemos o conhecimento e a experiência de Jesus Cristo, a fim de progredirmos na direção do homem perfeito, na medida da estatura de Cristo. Cristo é a cabeça do Corpo. O Corpo precisa estar unido e inseparável da sua Cabeça, para constituir-se uma só e única realidade, a saber, Cristo Cabeça e membros, o Cristo total.
Estamos hoje enfraquecidos e desanimados depois uma pandemia e divididos e separados depois de um pleito eleitoral. Fala-se de uma anemia eclesial, um adoecimento da Igreja. Fala-se de cicatrizes, feridas, rupturas no Corpo da Igreja. Precisamos costurar as rupturas, curar as feridas, enfaixar as quebraduras, construir a unidade do Corpo de Cristo. Esta é a vocação e a missão de todos os membros, chamados à unidade da fé e do Corpo do Senhor, mas particularmente é a missão dos ministros ordenados, a quem cabe a tarefa permanente de vigiar e restaurar a beleza testemunhal da unidade e da comunhão. Isso sem deixar de reconhecer a diversidade e a riqueza das diferenças que tenham o próprio Deus como autor. Somos, como ministros ordenados nos três graus, ministros e artífices da comunhão, da unidade, da coesão eclesial.
Que esta celebração que alegra o coração da nossa Igreja, que vive o terceiro ano vocacional no Brasil, possa religar-nos a Cristo, como seus discípulos missionários, em vários estados de vida e em muitas vocações, para que ele, e tão somente ele, faça arder nossos corações e nos conserve os pés no caminho da missão de anuncia-lo, torna-lo presente e faze-lo único amor e grande sentido da vida de cada ser humano.
Que a força e a ousadia dos mártires, sobretudo do jovem Sebastião, te acompanhem, Maurílio, e nós todos, para que a partir de Cristo possamos dar sentido e beleza verdadeira às nossas vidas e à nossa presença discipular e missionária neste mundo. Amém.
Paróquia São Sebastião/Nova Serrana, 26 de novembro de 2022
Dom José Carlos Campos / Bispo diocesano de Divinópolis-MG